Artigo baseado no relato de Gabriela de Mello da Trindade Souza, vivido no ano 2022
A minha decisão de ser missionária nasceu dentro da minha própria casa. Venho de uma família grande — meus pais tiveram seis filhos — e, na época, enfrentávamos muitas dificuldades. Foi nesse contexto que dois missionários bateram à nossa porta e nos apresentaram o Evangelho de Jesus Cristo.
A partir daquele momento, tudo mudou. Minha mãe, que lutava contra o vício do álcool e do cigarro, encontrou forças para abandonar esses hábitos e recomeçar. A atmosfera do lar foi transformada, e nossa família ganhou um novo rumo. Eu pude ver, com meus próprios olhos, a diferença que dois jovens dedicados ao serviço do Senhor fizeram em nossa vida.
Essa experiência despertou em mim o profundo desejo de também ser uma missionária, de levar essa mesma esperança a outras famílias, assim como havia acontecido com a minha.
Meu propósito ao servir uma Missão
Foi assim que, em 2021, enviei o meu chamado missiionário. Meu propósito era, antes de tudo, aprender a conhecer Jesus Cristo de forma mais íntima e profunda. Servir seria não apenas uma oportunidade de compartilhar o Evangelho, mas também de transformar a mim mesma. Minha conversão verdadeira começaria ali: conhecendo meu Salvador e ajudando famílias, assim como aqueles missionários ajudaram a minha.
Quando finalmente recebi o meu chamado missionário, os sentimentos foram intensos. Naquela mesma noite, rodeada por minha família e alguns amigos, abri a carta e li: Missão Brasil Goiânia.
Naquele momento pensei: “O Senhor precisa de mim agora, e eu preciso aproveitar cada instante dessa oportunidade.”

A experiência no campo missionário
No campo missionário vivi experiências grandiosas, que marcaram profundamente minha vida. Logo no início, percebi que a missão seria um momento crucial para minha fé. Eu sempre acreditei que tinha fé em Jesus Cristo, mas foi ali que aprendi o verdadeiro significado de confiar nEle em todas as coisas.
Na missão, aprendi que os milagres não são eventos distantes ou raros: eles acontecem todos os dias, nas pequenas e nas grandes coisas, sempre que exercemos fé em Jesus Cristo.
A partida para o outro lado do véu
Após o divórcio dos meus pais, quando eu tinha 10 anos, eu e meus irmãos passamos a ser criados apenas pelo meu pai. Ele foi meu maior exemplo de amor e resiliência. Desde o momento em que me recebeu de volta em casa, nunca deixou de acreditar em mim, mesmo quando muitos já haviam desistido.
Durante minha missão, ele me ligou em um de meus dias de preparação e disse palavras que guardo no coração até hoje: contou o quanto estava orgulhoso de mim, feliz por ver a pessoa que eu estava me tornando, por ter deixado tantas coisas para trás e por estar ali, servindo ao Senhor.
Aquelas palavras mexeram profundamente comigo. Pouco depois, em uma entrevista com meu novo presidente de missão, o presidente Hancock, ele me olhou nos olhos e perguntou: “Sister, o que está acontecendo?” Com o coração apertado, contei sobre a saúde do meu pai, mesmo antes de ele ser internado. Falei do medo que sentia, do pressentimento ruim que me acompanhava, e chorei em desespero.
Depois de me ouvir atentamente, o presidente fez uma pergunta que ficou gravada em minha alma: “Se o seu pai morrer, o que você vai fazer?” Eu demorei alguns minutos para responder, tentando encontrar forças dentro de mim. Por fim, disse: “Se meu pai morrer, eu quero terminar a minha missão, mas quero ter a oportunidade de me despedir do corpo dele.”
Ele apenas me respondeu com firmeza e amor: “Eu estou junto com você, Sister. O que acontecer, eu estarei aqui.” Essas palavras me deram coragem para seguir em frente, mesmo sem saber o que o futuro reservava.
Pouco tempo depois, meu pai adoeceu de forma grave e precisou ser internado. Logo foi entubado, e aquele se tornou um dos períodos mais desafiadores da minha vida. No começo, meu coração se encheu de questionamentos: por que isso estava acontecendo justo comigo? Eu havia confiado meu pai nas mãos de Deus para poder dedicar dezoito meses ao cuidado dos filhos Dele na missão — e, ainda assim, parecia que estava o perdendo.
Todos os missionários da minha missão jejuaram e oraram pela saúde do meu pai. Eu também clamei ao Senhor, mas em determinado momento percebi que precisava mudar minha oração. Ao invés de apenas pedir, roguei para que Ele me ajudasse a aceitar Sua vontade e desse forças a mim e aos meus irmãos, qualquer que fosse o desfecho.
No dia 1º de novembro, meu aniversário, tive medo de que meu pai partisse. Mas, naquele dia, ele voltou da sedação, mesmo fragilizado, e conseguiu me desejar parabéns. Disse que me amava — e aquele momento foi um presente de Deus para mim.
No dia seguinte, 2 de novembro, Dia de Finados, eu estava no cemitério com outros missionários, ajudando voluntariamente pessoas a encontrarem jazigos. Foi um dia muito triste. Eu queria gritar para todos ali que a morte não é o fim, que existe esperança além do túmulo.
No dia 3, nada em nosso planejamento missionário deu certo. Às 19h30, senti fortemente que precisava voltar para casa mais cedo, embora nosso horário fosse 21h30. Minha companheira achou estranho, mas me acompanhou. Pouco depois de chegar, recebi a ligação confirmando aquilo que meu coração já pressentia: meu pai havia falecido.

Quem era o meu pai para mim
O meu pai era muito mais do que apenas um pai. Ele foi meu amigo, meu confidente, meu maior apoiador e, de muitas formas, também foi como uma mãe para mim. Foi a pessoa que nunca desistiu de mim, mesmo nos meus momentos mais difíceis, e que sempre acreditou no meu potencial quando ninguém mais acreditava.
O amor que ele me oferecia me lembrava o amor do Pai Celestial: um amor incondicional, que permanece apesar dos erros e das quedas. Sentir esse amor me ajudava a compreender, de forma terrena, o quanto Deus também nos ama de maneira perfeita e infinita.
Meu pai foi a minha base. Eu carregava a insegurança de não saber como continuaria sem ele ao meu lado. Afinal, ele era um homem jovem, de apenas 52 anos, cheio de vida e saúde, que nunca havia ficado doente. Sua partida parecia impossível de aceitar. Para mim, ele será sempre meu herói. Um exemplo vivo de esforço, sacrifício e amor inabalável.
Quando meu pai faleceu, fui para o funeral e passei dez dias em casa, mas retornei à missão. Ao voltar, continuei meu trabalho com vigor e dedicação, mantendo o compromisso de ajudar aqueles filhos especiais de Deus, exatamente como meu pai sempre me ensinou a fazer: com amor, esforço e fé inabaláveis.

Confiar no plano de Deus
No início da minha missão, durante o treinamento missionário, ensinávamos repetidamente sobre o plano de salvação. Naquele momento, confesso que não entendia muito o porquê. Cheguei a comentar com minha companheira: “Nossa, todas as lições, todos os ensinamentos, falam sobre o plano de salvação? Por quê?” Ela olhou para mim e disse algo que jamais esqueci: “Talvez você tenha que aprender algo sobre o plano de salvação.”
Mal sabia eu que esse aprendizado se tornaria essencial para minha vida. Quando meu pai faleceu, faltavam apenas três meses para eu encerrar minha missão — três meses até ser recebida de volta em casa, em festa. Foi nesse período que compreendi plenamente a importância de confiar no plano de Deus.
Confiar no plano de Deus tornou-se meu alimento e meu sustento. Aprendi que as famílias podem ser eternas e que a vida na Terra não é o fim. Sei que, se cumprir meu papel e viver de acordo com os princípios do Evangelho, poderei reencontrar meu pai um dia. Essa certeza de que Deus guia nossos passos e que tudo faz parte de um plano maior me fortalece e dá esperança, mesmo nos momentos mais desafiadores.
O plano de salvação: um plano de felicidade
Retornar para cumprir os últimos três meses da missão não foi uma decisão difícil para mim. Desde aquela conversa com meu presidente, eu sabia, profundamente no meu coração, que ainda havia pessoas que eu precisava conhecer — pessoas que eu havia prometido a Deus que encontraria e ajudaria.
Durante esse período, estive em Uberlândia e tive companheiras incríveis ao meu lado. Conheci pessoas especiais, e parecia que as esperava há muito tempo, como se nossos caminhos estivessem destinados a se cruzar naquele momento. A certeza de que eu precisava voltar para completar minha missão era tão grande que não restava dúvida em meu coração.
Retornar para casa após a missão foi um momento desafiador. Confesso que me senti um pouco perdida, cercada por tantas informações e responsabilidades novas. Era preciso retomar a vida “normal”, adaptar-me novamente à rotina fora da missão.
Eu já havia decidido, no fundo do meu coração, que não permaneceria em casa por muito tempo. Um bispo da minha última área me ofereceu a oportunidade de ir para outra cidade, recomeçar a vida, estudar e trabalhar, e só depois, quando me mantivesse sozinha, poderia tomar decisões maiores.
Durante três meses, eu orei e jejuei para que Deus me orientasse sobre qual caminho seguir. Foi então que senti com clareza que deveria me mudar para uma cidade no interior de São Paulo, chamada Tapetininga, e não para Minas Gerais como inicialmente proposto. Essa decisão permitiu que eu ficasse próxima dos meus irmãos e da minha mãe, demonstrando mais uma vez como Deus guiou meus passos e esteve presente em cada escolha da minha vida.
Essa experiência me fez compreender ainda mais que o plano de salvação é, de fato, um plano de felicidade. Mesmo nos momentos de incerteza ou dor, podemos confiar que Deus sabe o que é melhor para nós e nos conduz com amor.

Nunca estou sozinha
Até hoje sinto a mão de Deus guiando minha vida, ajudando-me em cada passo, mesmo nos momentos em que estou sozinha em uma cidade nova, longe de familiares e amigos. Quando as pessoas comentam sobre minha situação, eu sempre respondo que nunca estou sozinha, pois o Senhor Salvador está sempre comigo.
Gostaria de compartilhar meu testemunho sobre o Evangelho de Jesus Cristo. Sinto imensa gratidão pela esperança que Ele me oferece todos os dias e, especialmente, pela infinita Expiação de Cristo. Sua Expiação não serve apenas para nos arrepender de nossos pecados, mas também nos sustenta em cada dificuldade e dor que enfrentamos.
Quando penso em Jesus Cristo no Jardim do Getsêmani, compreendo que Ele sentiu não apenas os nossos pecados, mas todas as dores, angústias e desespero que nós sentiríamos. Eu sei que, por Ele ter sentido tudo isso, Ele sabe exatamente como nos socorrer e nos fortalecer. A Expiação de Cristo é infinita e poderosa, aplicável a todos os momentos, para todas as pessoas.
Eu não sou melhor que ninguém. Sou humana, com erros e falhas. Ainda assim, o Evangelho de Jesus Cristo me guia, me fortalece e me sustenta nesta vida. Servir uma missão de tempo integral foi fundamental para que eu aprendesse e me transformasse. Talvez, se eu não tivesse servido, não tivesse retornado plenamente ao Evangelho.
Sou profundamente grata por cada experiência da missão e por tudo que vivi.
 
								


