Liderança religiosa e influencia política – uma lição da História da Igreja
As contendas políticas não são novidade. A História da Igreja contém valiosas lições que podemos tirar para nossa vida, inclusive em momentos de grande agitação política.
Quanto Utah se tornou um estado nos Estados Unidos, em 1896, várias discórdias e mal entendidos a respeito das questões políticas frutificaram entre os membros da Igreja. Até mesmo algumas Autoridades Gerais (líderes a nível mundial) foram afetadas, pois alguns faziam campanha pelas medidas políticas e candidatos democratas e outros pelos republicanos.
A questão política chegou ao auge quando em 1895, o Élder Moses Thatcher, do Quórum dos Doze Apóstolos, aceitou a nomeação do partido democrata para ser senador por Utah e o Élder B. H. Roberts, do Primeiro Conselho dos Setenta, concorreu a um cargo no congresso pelo mesmo partido. Eles sofreram medidas disciplinares por terem aceitado a nomeação sem consultarem primeiro seus líderes da Igreja. Nenhum deles foi eleito.
“Em abril de 1896, as Autoridades Gerais publicaram uma declaração formal, conhecida como a lei política da Igreja ou o Manifesto Político. Ele salientava a separação entre a igreja e o estado, bem como a intenção da Igreja de não interferir nos direitos políticos de qualquer de seus cidadãos. A declaração acrescentava ainda que para continuar havendo paz e boa vontade em Utah, era desaconselhável que os líderes mais importantes da Igreja “aceitassem cargos políticos ou empregos que os desviassem ou afastassem do cumprimento de seus deveres religiosos, sem antes consultar e obter a aprovação de seus associados e daqueles que os presidem” (História da Igreja na Plenitude dos Tempos, pg. 444)
A princípio, B.H. Roberts achou que o documento restringia seus direitos e recusou-se a assiná-lo. Depois que as outras Autoridades Gerais conversaram com ele, oraram com ele e procuraram fazê-lo compreender, ele por fim assinou o documento. Mas o Élder Moses Thatcher, de semelhantes esforços terem sido feitos por ele, ainda assim recusou-se a colocar sua assinatura no documento. Por esse motivo, ele foi desobrigado do Quórum dos Doze, apesar de manter sua condição de membro da Igreja.
O Manifesto Político continuou a ser o padrão que rege as atitudes da Igreja com respeito à política.
Moses Thatcher continuou fiel a Igreja, apesar de não fazer mais parte do Quórum dos Doze Apóstolos. No famoso caso do senador Reed Smoot, que era uma apóstolo ordenado, e concorrera ao Senado por autorização do Presidente da Igreja, Moses Thatcher teve um papel importante.
Quando o Élder Smoot chegou a Washington D. C. no final de fevereiro de 1903, foi apresentado um “protesto dos cidadãos” questionando a legitimidade do novo senador. Ele foi acusado de ser polígamo, o que não era verdade. Apesar de uma investigação ser aberta, Élder Smoot recebeu permissão para assumir seu cargo. Em março daquele ano, ele fez o juramento de senador. Como senador, suas habilidades administrativas, seu bom senso e integridade logo se tornaram evidentes. Ele também se tornou muito habilidoso como político, o que lhe foi muito útil no momento da votação final referente a seu caso.
“‘O Caso Smoot’, como passou a ser chamado, estimulou o reavivamento de velhas histórias anti-mórmons e inspirou a criação de novas. Vários jornais da época divulgaram essas mentiras.
Em janeiro de 1904, o senador Smoot preparou uma resposta formal às acusações que foram levantadas contra ele, mas as audiências propriamente ditas começaram somente em março. Sua honestidade e franqueza ao responder as perguntas conquistaram-lhe o respeito de muitos senadores. Outras testemunhas da Igreja foram James E. Talmage, que esclareceu pontos referentes a doutrina mórmon; Francis M. Lyman, Presidente do Quórum dos Doze Apóstolos; Andrew Jenson, historiador assistente da Igreja; B. H. Roberts; e Moses Thatcher, que havia sido desobrigado do Quórum dos Doze Apóstolos em 1896.
“O testemunho de Thatcher foi particularmente útil no sentido de refutar as acusações de que os líderes da Igreja “controlavam a vida dos santos. O testemunho desses líderes da Igreja ganharam a primeira página dos jornais do país.” (História da Igreja na Plenitude dos Tempos, pg. 469)
No começo de 1907, o Partido Republicano derrotou a proposta de que Reed fosse deposto de seu cargo. A vitória foi alcançada com a ajuda do presidente Theodore Roosevelt. Tendo alcançado essa vitória, o senador Smoot passou os vinte e seis anos seguintes na capital do país como uma de suas figuras mais influentes.
Desse trecho da História da Igreja tiro lições importantes para nós:
1º “Não cremos ser justo misturar influência religiosa com governo civil” (D&C 134:9). Porém, quando autorizado pela Primeira Presidência, uma Autoridade Geral pode participar de pleitos e assumir cargos públicos, como no caso citado acima – e também no caso do Presidente Ezra Talf Benson, que foi Secretário da Agricultura dos EUA à convite do Presidente Dwight D. Eisenhower. Ele, como membro do Quórum dos Doze Apóstolos, só aceitou o convite após receber permissão do Presidente David O. McKay. (É importante salientar que isso possui amparo escriturístico: Néfi foi rei e profeta, bem como Benjamim, Mosias, etc. Vemos o irmão de Jarede, Abraão e Moisés como lideres espirituais e seculares. Joseph Smith foi prefeito e concorreu a Presidência dos EUA. Em todos estes casos, até onde pode ser investigado, verifica-se a liberdade religiosa, respeito as minorias de outras crenças e cuidado para não favorecer uma comunidade religiosa em detrimento de outra)
2º Existe divergência política entre os membros da Igreja e mesmo entre os líderes. Isso é normal. Mas essas divergências não devem fazer com que nos tornemos inimigos – e abandonemos o mais importante: nossa fé, nossos convênios e nossa religião. É por isso que institucionalmente a Igreja é neutra. E embora incentive seus membros a participarem do processo político e votarem, não permite que seus prédios sejam usados para campanhas – e não endossa um ou outro candidato.
3º Quando nossos líderes gerais decidem somos convidados a segui-los. B.H. Roberts e Mosees Thatcher foram admoestados e convidados a mudar sua visão sobre política e religião. O primeiro o fez, mas o segundo não. Ele perdeu sua posição do Quórum dos Doze, mas continuou fiel. Ele poderia ter ficado magoado e recusar-se a testemunhar no caso de seu ex-colega de Quórum, que diferente dele havia obtido permissão para, como Autoridade Geral, adentrar na política. Seu testemunho foi “particularmente útil no sentido de refutar as acusações de que os líderes da Igreja controlavam a vida dos santos”.
4º As Autoridades Gerais não se manifestam politicamente, exceto quando autorizadas pela Primeira Presidência. Entretanto, os demais membros, inclusive pessoas influentes na sociedade e que já serviram como líderes na Igreja, são livres para emitir suas opiniões políticas, desde que não deem a entender que falam em nome da Igreja. O Manifesto Político, portanto, ainda é válido em nossos dias.
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