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Jesus Cristo casou?

Vou direto a resposta: não sabemos. Não sabemos se Jesus Cristo, o Salvador do Mundo casou-se. Várias religiões afirmam veemente que o Senhor não poderia casar-se, preservando um celibato exemplar [1]. Entretanto, procurarei demonstrar que, para os membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, o casamento de Cristo, se ocorrido, não traria problemas doutrinários – na realidade, talvez até reforçasse a doutrina que acreditamos.

A origem

A ideia de Cristo ter-se casado advém principalmente de escritos apócrifos.

O “Evangelho da Esposa de Jesus”, como foi apelidado um desses textos apócrifos, é um enxerto, não maior do que um cartão de visitas, contendo uma pequena referência de Jesus dizendo as palavras “minha esposa” e também se referindo a uma discípula chamada “Maria”. Todavia, os pesquisadores não chegaram a um consenso sobre a autenticidade do pergaminho [3].

Na Teologia da Igreja não existe uma posição oficial da Igreja a respeito. Alguns líderes manifestaram sua opinião pessoal de que Cristo poderia ter sido casado, mas sempre concluindo que não existe revelação especifica sobre o tema.

O fraco argumento de que Cristo é literalmente casado com a Igreja nem será debatido aqui. Afinal Cristo usou tal ensinamento como símbolo. Deve-se também considerar que a intenção de Mateus, Marcos, Lucas e João (os evangelistas) era a de propagar os ensinamentos de Cristo – eles falaram pouco sobre a vida privada do Senhor. Contudo, afirmaram que havia “ainda muitas outras coisas que Jesus fez; se cada uma das quais fosse escrita, suponho que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se escrevessem” (João 21:25)

Os indícios

Alguns indícios que reforçam a tese de que Jesus foi casado são:

  • Jesus era um homem de 30 anos quando começou seu ministério – um homem nesta idade, entre o povo judeu, já deveria estar casado. Especialmente se fosse rabino (um mestre). E Cristo era rabino.
  • Jesus realizou seu primeiro milagre publico em uma festa de casamento (João 1:1-11), que alguns indicam ter sido a de Seu próprio casamento, pois ao noivo caberia resolver questões a respeito da festa.
  • Jesus contou diversas parábolas sobre o casamento e o pai de família – indicando que conhecia muito bem o relacionamento conjugal e familiar (Lucas 22:11, Mateus 20:11, Mateus 24:43, João 3:29, Marcos 2:19, etc.)
  • Jesus apareceu, após ressuscitar, primeiramente a Maria Madalena (João 20:13-17). Ele se revelou a ela antes mesmo de apresentar-se perante o Pai Celestial. Maria tentou abraçá-lo, mas ele a impediu, pois não tinha subido para o Pai.
  • Jesus imita o Pai em todas as coisas (João 5:19). Sendo o Pai Celestial um ser casado [4], Cristo deve tê-lo seguido: casando-se.
  • Para entrar no mais algo grau de glória Cristo precisaria se casar. “Para obter o [grau] mais elevado [no Reino Celestial], um homem precisa entrar nesta ordem do sacerdócio [que significa o novo e eterno convênio do casamento]. E se não o fizer, não poderá obtê-lo. Poderá entrar em outro, mas esse será o fim de seu reino; ele não poderá ter descendência.” (D&C 131:2-4)

Apesar desses pontos serem interessantes não sabemos se Cristo realmente casou. Podemos rebater cada um dos argumentos apresentados acima, com a mesma propriedade:

  • Jesus é um pregador atípico – um homem diferenciado – e não precisava seguir os costumes judeus – e até por isso mesmo foi criticado e perseguido. El não seguia a “maneira dos judeus”.
  • As bodas de Caanã não são necessariamente a festa do casamento de Jesus. O texto não diz isso explicitamente, em nenhuma versão antiga (grega, latim, aramaico). A mãe de Jesus teria procurado Seu filho sabendo que Ele teria poder para solucionar o problema da falta de vinho – e não porque ele era o noivo (na Tradução de Joseph Smith da Bíblia João 2:4 – “Disse-lhe Jesus: Mulher, o que desejas que eu te faça, isto farei; pois ainda não é chegada a minha hora” – revela que de boa vontade Jesus procuraria resolver o problema da falta de vinho, mas não indica que a festa era Dele).
  •  Jesus Cristo, o Senhor e Salvador, devido a seus atributos divinos, podia conhecer todas as coisas e ser um conselheiro perfeito sobre o matrimonio e vida familiar – a despeito de casar-se ou não.
  • O privilégio de Maria Madalena não revela necessariamente que ela era esposa de Cristo. O Elder Bruce R. McConkie, um dos maiores teólogos da Igreja, disse: “Existe muita coisa na morte, sepultamento e ressurreição de nosso Senhor que enobrece e exalta as mulheres fiéis. Elas choraram ao vê-lo na cruz, procuraram cuidar de seu corpo ferido e inanimado, e vieram a seu sepulcro prantear e adorar aquele que fora seu amigo e Mestre. Não é de estranhar, portanto, que encontremos uma mulher, Maria Madalena, sendo escolhida entre todos os discípulos, inclusive os apóstolos, para ser o primeiro mortal a ver e curvar-se na presença de um ser ressuscitado. Maria, a quem muito se perdoou e que muito amou, viu o Cristo Ressuscitado!” [5] Algumas outras mulheres viram o Salvador antes dos Apóstolos – que eram os discípulos mais achegados (Mateus 27:62-69, 28:1-4 e 11-15).
  • Embora Cristo siga o Pai, isso não significa que o Salvador tenha se casado enquanto na mortalidade. Conforme ensinado por muitos profetas e apóstolos: aqueles que não tiverem a oportunidade de se casar na mortalidade, mas foram justos – terão essa possibilidade depois [6].
  • Entrarão também no mais alto grau de glória do Reino Celestial: as pessoas que não tiveram a oportunidade, devido as condições da mortalidade, de casarem-se – vivendo assim a plenitude das bênçãos do evangelho (D&C 137:7). Cristo já era Deus antes de nascer – e manteve seu posição de glória depois da mortalidade, mas então com um corpo ressurreto – e isso independe de casamento.

Conclusão

Como se percebe é difícil concluir, pelo que temos, que Cristo foi casado – ou concluir que Ele não foi casado. Por isso não é apropriado ensinar a respeito durante as aulas da Igreja. Podemos especular e buscar revelação a respeito – e sem dúvida podemos chegar a alguma conclusão. Mas sem um ensinamento endossado pelas Autoridades Presidentes da Igreja – a Primeira Presidência e o Quórum dos Doze Apóstolos – nossa melhor resposta ainda será: não sabemos.

Isso não deve nos desanimar, pois Deus revelará todos os mistérios (D&C 76:7). Cremos que muitas revelações ainda estão para vir (9º Regras de Fé). E que chegará o dia em que nada estará oculto (Eclesiastes 12:14). Enquanto isso, concentremo-nos no que Deus já revelou!

Para finalizar afirmo que se Cristo foi verdadeiramente casado enquanto na mortalidade isso não causa nenhuma aberração doutrinária – e não nos faz abandonar nenhum aspecto do Plano de Salvação. Afinal, o casamento é o caminho estreito e apertado que conduz a vida eterna [7], e a instituição de uma família o padrão de verdadeira felicidade [8].

 

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NOTAS

[1] Negam o casamento de Cristo: os Testemunhas de Jeová, Grupos Evangélicos, A Igreja Católica, entre outros

[2] Saiba mais sobre este texto gnóstico aqui.

[3] “Estudos feitos no ano passado estipularam que o documento foi originado entre os séculos VI e IX Depois de Cristo (D.C.). Mas Christian Askeland, pesquisador associado do Instituto de Pesquisa Bíblica e Septuaginta de Wuppertal, na Alemanha, acredita que as similaridades entre o evangelho e o papiro contendo o Evangelho de João indicam que ambos são falsos.

Segundo o professor, a datação feita por radiocarbono mostrou que o Evangelho de João foi escrito há 1200 anos e em uma língua extinta há 300, portanto, o documento era falso. De acordo com ele, a chance do Evangelho da Esposa de Jesus ter sido escrito pelo mesmo autor é grande, o que comprovaria que ambos são forjados.

Porém, pesquisadores da Universidade de Columbia estão fazendo novos testes e dizem que os primeiros resultados descartam a teoria de Askeland.

James Yardley, que está trabalhando nas pesquisas, disse à publicação LiveScience que “em nossos primeiros testes, já podemos dizer que as tintas usadas nos dois papiros (no Evangelho da Esposa de Jesus e no Evangelho de João) são bem diferentes. Os resultados recentes confirmam fortemente essa observação”. Yardley afirmou que não daria mais detalhes até que o estudo fosse divulgado.

Apesar das evidências levarem a crer que o evangelho encontrado seja verdadeiro, ainda não há uma resposta de como isso afetaria o cristianismo.

A professora Karen King, especialista da área de teologia de Harvard, que anunciou a descoberta do texto em 2012, disse que enquanto o documento não prova concretamente que Jesus tinha uma esposa, ele pode iniciar um debate sobre os primeiros cristãos e se o “modo ideal” de viver é o celibatário.” – “Novas evidências reforçam a teoria de que Jesus era casado” – Terra Notícias. Ver também: “New evidence backs papyrus suggesting Jesus had a wife – and Mary Magdalene was a disciple”, The Independent

[4] Faz parte da Teologia Mórmon a crença em uma Deusa, esposa do Pai Celestial. Para saber mais leia aqui.

[5] “Vida e Ensinamentos de Jesus e Seus Apóstolos” – Manual do Aluno do Instituto, pg. 260; ver também: DNTC, Vol. 1, pg. 843)

[6] O Presidente Boyd K. Packer ensinou: “Aqueles que não se casam ou que não podem ter filhos não estão excluídos das bênçãos eternas que buscam, mas que, por enquanto, estão além de seu alcance. Nem sempre sabemos como ou quando as bênçãos virão, mas a promessa de descendência eterna não será negada a nenhuma pessoal fiel que fizer e guardar convênios sagrados.

Seus anseios e suas súplicas lacrimosas particulares tocarão o coração tanto do Pai quanto do Filho. Vocês receberão a garantia pessoal Deles de que terão uma vida plena e de que não perderão nenhuma bênção essencial.

Como servo do Senhor, agindo no ofício ao qual fui ordenado, faço às pessoas que estão nessa situação a promessa de que nada que seja essencial a sua salvação e exaltação deixará de lhes ser concedido no devido tempo. O que carecem hoje lhes será provido em abundância, e o coração partido por sonhos e anseios desfeitos será curado.” (“O Testemunho”, Conferência Geral, abril de 2014)

[7] “O casamento para o tempo e a eternidade é o caminho estreito e apertado (mencionado nas escrituras) “que leva à exaltação e à continuação das vidas, e poucos há que o encontram”, mas “larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz às mortes; e muitos há que entram por ela”. (Doutrina e Convênios 132:22,25) Se Satanás e suas hostes conseguirem persuadi-los a seguir o caminho largo do casamento do mundo, que termina com a morte, ele os terá feito perder a oportunidade de alcançar o mais alto grau de felicidade eterna por meio do casamento e da progênie eterna. Agora deve estar claro em sua mente por que o Senhor declarou que, a fim de chegar ao mais elevado grau da glória celestial, é preciso entrar no novo e eterno convênio do casamento. Do contrário, não é possível alcançá-lo. (Doutrina e Convênios 131:1–3.)” (Presidente Harold B. Lee, Decisions for Successful Living, pg. 125–127, ver também Ensinamentos dos Presidentes da Igreja: Harold B. Lee)

[8] Ver Família: Proclamação ao Mundo.

| Para refletir
Publicado por: Lucas Guerreiro
Escritor, Advogado, Membro da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB/SP, Membro da J. Reuben Clark Law Society São Paulo. Fez Missão em Curitiba - Brasil. Gosta de desenhar, estudar filosofia, fotografar, viajar e assistir series de super-heróis.
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